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JJ Redick, ex-jogador do Clippers, Magic (entre outros), recentemente declarou, numa discussão com o jornalista Mad Dog Russo na ESPN, que Larry Bird (Larry Legend, um dos grandes da história do basquete) não está entre os top 5 jogadores da NBA na história em cestas de três pontos; segundo Redick, isto seria um fato de acordo com as estatísticas de Bird, que teve menos arremessos convertidos e pior porcentagem que vários jogadores mais recentes da liga. Ademais, compartilhou sua visão de que a NBA hoje seria tão “física” quanto os anos 80. Tais declarações motivaram respostas duras de lendas da NBA como Dominique Wilkins e Michael Cooper.

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Não é a primeira vez que o ex-Clipper desmerece craques do passado, (apesar de advertir que não o faz, antes e depois de fazer suas ácidas críticas), principalmente aqueles de antes dos anos 80 (quando, segundo ele, se iniciou a NBA moderna). No ano pretérito ele disse que Bob Cousy (o “O Houdini de Hardwood”, lendário armador do Celtics, MVP da liga em 1957) jogava contra “plumbers and firemen” (encanadores e bombeiros), além de não saber driblar com a mão esquerda, e ter uma baixa porcentagem nos seus arremessos de quadra. JJ convenientemente esquece que a liga no geral à época possuía números menores naquela área, e que a NBA aplicava duramente as violações no manejo da bola (várias dribles e manobras tolerados hoje seriam considerados ilegais no passado). De resto, Redick ainda demonstra ingratidão ao indicar que alguns jogadores tinham que trabalhar em “empregos normais” durante as férias; ora, isso acontecia porque não havia tanto dinheiro envolvido no basquete daquela época. Jamais se deve esquecer que, graças as lendas do passado, a NBA alcançou a popularidade e enorme sucesso financeiro que vigoram atualmente. Nesse momento, importante lembrar da célebre frase de Isaac Newton: “Se eu vi mais longe, foi por estar sobre ombros de gigantes”.

Pode-se perceber nessas declarações que o ex-Clipper tem dificuldades em fazer interpretações rebuscadas quando compara jogadores de épocas diferentes. Obviamente, presumo que ninguém discute que, em média, os atletas hoje são mais fortes e mais habilidosos (principalmente nas cestas de 3, que hoje dominam a liga). Contudo eles são fruto de sua geração e de todo o trabalho feito pelas anteriores. Quando se fala, por exemplo, que Bob Cousy foi maior que Redick, não se quer dizer que o primeiro seria superior ao segundo se pudéssemos transportá-lo numa máquina do tempo para os tempos atuais, mas que o Houdini foi, por grande margem, superior com mais intensidade em relação aos seus contemporâneos que JJ em relação aos seus.

Também não faz muito sentido a contestação específica apenas contra atletas anteriores aos anos 80. Ora, como ficaria a situação de Dr. J e Kareem Abdul-Jabbar? Ambos tiveram seus auges na década de 70, porém permaneceram estrelas na década seguinte. Vale lembrar que um jovem Kareem (então Lew Alcindor) teve batalhas épicas contra um já veterano Wilt Chamberlain (draftado em 1959), cujo maior rival na carreira foi Bill Russell (parceiro de Cousy em muitos títulos). Por que a grandeza de Kareem poderia entrar em comparações com jogadores atuais, mas não as de Russell e “Houdini”? Não faz muito sentido, caros leitores.

Pois bem, seguem abaixo os números.

NBA durante a carreira de JJ Redick: 2006-07 a 2020-21:

3PM 8.4, 3PA 23.4 e 3P% 35.8

JJ Redick:

3PM 2.1, 3PA 5 e 3P% 41.5

Logo, JJ teve diferença positiva de 5.7% em relação à média dos seus contemporâneos em aproveitamento de cestas de 3 pontos.

NBA durante a carreira de Larry Bird – 1979-80 a 1991-92:

3PM 1.3, 3PA 4.4 e 3P% 30.5

Larry Bird:

3PM 0.7, 3PA 1.9 e 3P% 37.6.

Assim, Larry Bird teve diferença positiva de 7.1% em relação à média dos seus coetâneos em aproveitamento de cestas de 3 pontos.

NBA durante a carreira de Stephen Curry (craque do Warriors ainda em atividade) – 2009-10 a 2021-22:

3PM 9.2, 3PA 25.7 e 3P% 35.7

Stephen Curry:

3PM 3.8, 3PA e 8.8 3P% 42.8.

Logo, Stephen Curry teve diferença positiva de 7.1% em relação à média dos seus contemporâneos em aproveitamento de cestas de 3 pontos.

Através dos números, constata-se que Bird e Curry tiveram igual superioridade no aproveitamento em relação aos seus respectivos coetâneos; e ambos melhores que o JJ Redick.

Alguém, com razão, pode dizer que havia menor número de arremessos nos anos 80, e argumentar (equivocadamente) que Bird teria uma porcentagem pior se arriscasse mais bolas de 3.  Como refutar tudo isso?

Realmente havia um número diminuto de cestas de longa distância, todavia não se deve esquecer que Larry atuou num basquete universitário que não possuía cestas de 3, logo foi na NBA onde ele teve seu primeiro contato em nível de competição com esse tipo de arremesso. Outro fator importante: ao contrário do cenário atual, a cesta de 3 não era parte chave do jogo; era vista como último recurso — muitas vezes arremessos desesperados nos últimos segundos da posse de bola. Factível crer que se crescessem e desenvolvessem suas habilidades sob a realidade atual, Bird e outros basquetebolistas de seu tempo tentariam mais bolas de 3 e as acertariam com melhor eficácia. Outrossim, impera informar que as estrelas jogavam mais minutos por jogo, e a fadiga costuma diminuir a porcentagem de acerto. Os números também reforçam os meus argumentos, pois os piores anos em aproveitamentos de 3 de Larry Legend ocorreram justamente quando ele arremessou menos de 1 vez por jogo; período de 1980-81 to 1983-84, quando ele teve apenas 25.7% de aproveitamento em 0.9 tentativas. Enquanto Reddick, de modo semelhante, teve pior aproveitamento nas temporadas nas quais menos tentou (menos de 4 por jogo); período de 2006-07 a 2010-11, no qual arremessou 39.4% por jogo (importante salientar que Curry não viu muita variação na sua porcentagem durante a carreira; outro fator que o favorece em relação ao craque do Celtics).

Os argumentos acima de igual modo servem na disputa Bird-Curry, no entanto o leitor mais atento percebeu que, apesar dos números apontarem que os dois eram similarmente superiores aos outros atletas de suas décadas, afirmei no título que Bird foi “quase tão bom” de 3 quanto o craque do Warriors; por quê? Pois a meu ver não há como negar que a revolução da NBA no jogo de longa distância tem em Curry seu principal representante; a temporada 2021-2022 acabou com mais de 35 bolas de 3 por jogo tentadas por cada equipe, contra 18.1 em 2009-2010, estreia do armador na liga. Cabe ainda ressaltar 2 fatores favoráveis ao Warrior: ele não viu muita variação na sua porcentagem durante a carreira, independentemente do número de arremessos; e tenta corriqueiramente arremessos muito atrás da linha de 3 pontos (e acerta várias!), algo impensável duas décadas atrás.

Enfim, só se enfrenta quem estava disponível para combate e de acordo com as regras e condições de sua própria época; logo um atleta deve ser sempre  julgado apenas pelo que fez no seu tempo. Quando se compara jogadores de décadas diferentes, eis a questão principal: qual dos dois foi superior com mais intensidade em relação aos seus contemporâneos? Por essas e outras razões acima explicadas, acredito ser possível responder a pergunta e afirmar que, nas bolas de 3, Bird foi maior que Redick e quase tão grande quanto Curry.

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